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quarta-feira, 30 de novembro de 2011

10 passos para uma igreja melhor. Passo 7: Atenção aos diversos grupos (1. Co.11)


Nos últimos passos, vimos que uma igreja sadia é missionária, bibliocêntrica,  dependente do Espírito, sincera, não apegada a coisas e colaboradora. São coisas que parecem óbvias, mas que não conseguimos enxergar em muitas comunidades de fé nestes dias. Hoje, iremos abordar outro aspecto que deve ser observado em uma igreja sadia, e ele tem a ver com o amor ao próximo: O cuidado e atenção às necessidades dos diversos grupos da igreja.

Não é muito óbvio para os fieis em geral, mas uma igreja possui uma multitude de pessoas. São adultos casados, solteiros, viúvos e divorciados; idosos saudáveis e doentes; jovens casados, solteiros e enrolados; adolescentes que querem namorar; homens universitários, trabalhadores liberais ou desempregados; juniores; crianças... Cada membro da igreja possui necessidades, e as igrejas sadias são aquelas que procuram entender e atender essas necessidades dentro das suas possibilidades.

O grande problema é que algumas igrejas não entendem isso. Existe, em algumas comunidades, uma certa competição pelos recursos comuns. Todos os grupos desejam que seus ministérios prosperem, tornem-se modelos para outras igrejas, conquistem muitas almas para Cristo. Por causa disso, em algumas comunidades, surgem brigas e facções que acabam dividindo o corpo de Cristo. Em outras comunidades, algum grupo específico acaba dominando os trabalhos e se esquece do restante. São igrejas que investem milhões na área de música, mas investe centavos no ministério de adolescentes, ou igrejas que vertem todos os seus recursos para o ministério jovem e se esquecem da galera da melhor idade.

Quando estudamos a história da igreja, podemos ver que houve uma preocupação dos discípulos em evitar as murmurações por conta de privilégios na distribuição dos recursos. Em Atos 6.1-6, vemos que as viúvas de origem grega estariam sendo preteridas na distribuição dos alimentos. Pensando em atender a suas necessidades, os discípulos delegam a tarefa de cuidar destas viúvas a sete homens, todos de origem grega, para cuidar delas. O texto não menciona o quanto foi distribuído e por quanto tempo, porém ele deixa claro que o problema foi solucionado, pois não é mais mencionado em nenhum texto bíblico.

A preocupação da igreja com determinados grupos, para evitar confusões, também é expressa por Paulo na sua 1ª. Carta aos Coríntios, capítulo 11. Neste texto, Paulo admoesta os cristãos ricos, que conseguiam chegar cedo para a celebração da ceia e comiam e bebiam até se embriagar, enquanto que os pobres e trabalhadores, que chegavam mais tarde, não conseguiam aproveitar a cerimônia comunitária.

É claro, isso não significa que um ministério não possa focar em uma área específica. Entretanto, eu creio que o melhor, para uma igreja realmente sadia, é que a igreja nasça focada, em vez de se tentar modificar a estrutura de uma igreja existente. Porém, esta igreja deve saber que os tempos mudam, as pessoas envelhecem, mudam de faixa etária e categoria e podem acabar se sentindo prejudicadas. Por isso, o ideal é uma igreja equilibrada, pois:

1.       Uma igreja equilibrada alcança mais pessoas para Jesus: Se você foca em um grupo, acaba reduzindo as possibilidades de evangelização e segrega o evangelho no processo, deixando as pessoas ignoradas à mercê de outros grupos menos sérios.

2.       Uma igreja equilibrada mantém as pessoas na comunidade por mais tempo: É muito bom ver famílias inteiras surgirem e crescerem em uma igreja, mas isso só ocorre quando a comunidade atende a todas as faixas etárias pelas quais essas pessoas podem passar.

3.       Uma igreja equilibrada minimiza conflitos: Se os vários grupos são atendidos pela comunidade, dificilmente acontecem razões para confusões ou ciumeiras por privilégios dados a um ou outro grupo.

É claro, uma igreja equilibrada não está isenta de conflitos. Por causa do egocentrismo humano, alguns líderes podem querer desequilibrar a balança para um ou outro lado. Neste caso, cabe ao pastor, o líder máximo da igreja, orientar, conforme a instrução da Palavra de Deus, os rumos a serem seguidos. Esse papel não é fácil, porém deve ser respeitado. 

Dia do evangélico

Hoje resolvi dar uma surfada nos Trending Topics do Twitter e descobri que é Dia do Evangélico. Conforme Lei Federal nº 12.328/2010, o dia 30 de novembro foi dedicado a homenagear a confissão religiosa que mais cresce no Brasil. A quantidade de pessoas postando no Twitter seu orgulho de ser evangélico é enorme, levando o termo aos TTs do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Quando eu penso no assunto, me surgem vários questionamentos. Será que o crescimento evangélico, no Brasil, tem sido saudável? Afinal, grupos religiosos como a Universal, a Mundial e a Internacional (curiosa a similaridade dos nomes, não?) se dizem evangélicos. Não só isso, sabemos que ser evangélico virou moda para muitos, enquanto outros dizem ser evangélicos apenas porque desejam receber as bênçãos de Deus, sem pensar em viver segundo os desígnios Dele.

Quanto mais eu medito sobre o tema, mais eu percebo uma coisa: Nós não conseguimos nos contentar com a vida que Deus nos dá. Queremos mais, muito mais. Queremos sucesso, queremos mídia, queremos dominar as opiniões, os costumes, o mundo, e não para Cristo, mas para podermos sair da marginalidade e sermos reconhecidos como um povo sério, que tem representatividade, que existe e está aqui para ficar. Os mais escusos querem dominar os outros para alcançar seus próprios sonhos materiais e financeiros. Infelizmente, não aceitamos que Jesus não veio para dominar este mundo, porque o mundo Dele não é esse. Não aceitamos que Cristo não veio dar riquezas terrenas, porém de uma vida plenamente feliz, uma vida eterna de comunhão com Ele.

Alguns irão dizer: Não aceito mesmo, eu quero receber as promessas de Deus em minha vida. Eu também quero! Eu quero morrer e ser ressuscitado, eu quero ver meu corpo glorificado, eu quero subir com Cristo, eu quero habitar com Ele na Nova Jerusalém. Tudo isso, eu tenho certeza. O resto, é consequência. Consequência de uma vida frutífera na Terra, onde semeei a Palavra a colhi almas para Jesus. Riquezas, prefiro aspirar as que vem do Alto. Prefiro a sabedoria divina do que as riquezas do mundo. Prefiro a Paz que excede a todo entendimento ao estresse da vida moderna. Prefiro as coisas básicas que o Senhor me acrescenta a cada dia do que o ouro mundano, pois não quero nada que venha a me afastar de Deus, que me impeça de entrar no Reino Dele, como o camelo que não passa pelo fundo da agulha.

Por fim, alguns irão dizer: Eu quero ver o Reino de Deus agora, eu quero receber as suas bênçãos agora. Eu digo: Eu já vejo, eu já recebi. Tenho um emprego, uma bela esposa, um teto sobre minha cabeça e, acima de tudo, tenho a certeza de que a minha missão nesta Terra é pregar o evangelho, a boa nova, de que Jesus veio para dar vida aos mortos, consolar os que choram, curar os enfermos e levantar os caídos. O resto, como diria o outro, é a mais pura vaidade.

O eterno debate sobre tolerância religiosa

Nos últimos dias, o mundo evangélico tem sido assolado por um debate que teima em aflorar de tempos em tempos: A tolerância religiosa. Graças a duas reportagens, uma da revista Época e outra do conhecido jornal The New York Times, tem-se acendido uma fogueira de vaidades curiosa, onde nenhum dos lados reconhece suas falhas.

Tudo começou com uma pequena reportagem no site da revista Época sobre um diálogo que teria ocorrido entre a jornalista Eliane Brum e um taxista evangélico, após sua chegada na cidade de São Paulo. Neste diálogo, a repórter se mostra ofendida por ter sua fé no nada (ela é ateia convicta) questionada pelo taxista e pela tentativa pobre de evangelização por parte dele. No diálogo, a jornalista mostrou-se chateada porque o motorista tentou tirar a sua "não-fé", enquanto ela não estaria tentando tirar a sua fé. O diálogo completo e o comentário da autora pode ser lido clicando aqui.

Apesar das opiniões da jornalista serem bem centradas e coerentes, ela irritou alguns setores do meio evangélico, em especial o líder mais controverso dos dias de hoje, Silas Malafaia, pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Malafaia, que tem sido centro da controvérsia neopentecostal nos últimos anos devido a sua adoção de campanhas de semeadura de oferta em troca de bênçãos divinas, chamou a jornalista de "vagabunda" diversas vezes durante uma entrevista dada por ele ao jornal The New York Times, que erroneamente o caracterizou como o líder máximo da igreja evangélica nacional. Este comentário levou a própria jornalista a responder dizendo que Malafaia comprovou o acerto e a relevância de seu artigo.

Esta confusão tem gerado muitas palavras de apoio por parte da sociedade à jornalista, porém mostra apenas uma face do debate. É verdade que o movimento evangélico tradicionalmente não é tolerante a outras correntes religiosas e tem muitas dificuldades de diálogo com o ateísmo. Entretanto, dizer que o preconceito vem apenas do lado evangélico não é verdade. O movimento ateu moderno tem investido muito tempo e dinheiro para forçar o seu ponto de vista a outras pessoas. Os cristãos, e os evangélicos em especial, são taxados de "bitolados", "tacanhos", e daí pra baixo, quando ousam defender a sua visão de fé contra pessoas ateias que dizem que acreditar em Deus é uma palhaçada.

Como pastor, conheço inúmeras histórias de pessoas que sofreram este tipo de preconceito por parte de ateus. O meio acadêmico, em especial, demonstra isso. O curso de pós-gradução em História Comparada, por exemplo, não admite a entrada de alunos de Teologia em seu curso, apesar de ser uma matéria que compara diversas disciplinas humanas para estudar o passado (Sociologia e Filosofia entram, por exemplo). Não só isso, pesquisadores teólogos precisam sempre defender a cientificidade da disciplina em debates sobre temas afins à Teologia, como ecologia e sustentatibilidade. Já ouvi histórias de alunos universitários ofendidos ou ridicularizados por professores ateus por ousarem dizer que discordam da visão ateia da vida e da humanidade. Recentemente, até mesmo uma monografia foi recusada em um curso da Universidade Rural de Pernambuco por conter um agradecimento a Deus (a monografia não foi considerada um "trabalho científico" por causa disso).

A grande dificuldade do movimento ateu com o cristianismo é que, por não crerem em sua existência e por adotarem uma visão positivista da realidade, não admitem que qualquer manifestação ostensiva sobre Deus ou sobre religião. Por isso surgiram moções como a retirada dos crucifixos e símbolos religiosos do Congresso Nacional (apesar da Constituição mencionar Deus em seu preâmbulo) no Brasil e a extração da Cruz de metal do World Trade Center, em Nova Iorque, nos EUA. Não admitem visões opostas à sua postura de "não-fé", e, por isso, sentem-se confrontados, intimidados e amedrontados com a visibilidade da fé e esperança dos outros.

A moral da história é que, se temos que falar em tolerância religiosa, devemos falar de tolerância em todos os âmbitos da sociedade. Isso significa dialogar com cada visão, sem agressividade ou menosprezo. Isso significa admitir que cada lado exponha a sua postura e que cada lado tenha seus postulados criticados. Ciência, segundo Karl Popper, é o conhecimento que admite ser falseado. Se não houver esta possibilidade, não é conhecimento científico. Por isso a Teologia é uma ciência: Ela admite ser falseada, mas também se reserva ao direito de defender seus postulados. E por isso o Ateismo, enquanto não admitir ser falseado e não abrir o diálogo da "não-fé" com a "fé", sem preconceitos, não tem como ser respeitado como uma posição honestamente tolerante, religiosamente falando.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Santidade: Um desafio perpétuo (Texto base 1 Co. 1.1-3)


Texto-base: 1 Co. 1.1-3


Introdução: Nos dias de hoje, prega-se muito pouco sobre santidade. Não se enganem. Talvez vocês tenham ouvido diversas mensagens sobre santidade nas suas vidas, porém sempre com uma conotação básica: Precisamos nos santificar, precisamos nos consertar de nossos maus caminhos. Neste processo, talvez você tenha ouvido comentários, críticas, a respeito de algum comportamento seu. Da mesma forma, talvez você se ache o guardião da moral e dos bons costumes e faça de sua especialidade criticar os outros. É por isso que o Pr. Wellison tem trabalhando tanto sobre o tema santidade na nossa igreja.


Quando pensamos em santidade, imaginamos pessoas que não tenham a menor possibilidade de defeitos. Pensamos que o processo é como o de uma bola de neve, que vai crescendo exponencialmente. Eu estou aqui para lhes dizer que não é tão simples assim. Pelo contrário, se fosse assim, não teríamos tantas exortações e comentários para as igrejas primitivas. Se fosse assim, não teríamos exemplos de pessoas querendo aparecer logo após a formação da igreja, como Ananias e Safira. 


É por isso que vim hoje a vocês, usando o exemplo de Corinto, para trazer três detalhes sobre o tema que precisamos nos atentar, quando pensamos sobre este tema.

1.    A igreja é um local para pessoas imperfeitas, por isso não é justo cobrar perfeição delas (1 Co. 1.26-27): O evangelho sempre foi uma mensagem que apelou mais para aqueles que eram excluídos e ignorados pela sociedade do que aqueles que eram vistos como perfeitos por ela. Jesus sempre disse que veio para cuidar dos doentes, não só do corpo, porém especialmente da alma. Somente os que se percebem imperfeitos se deixam cuidar por Jesus, por isso é de se esperar que a igreja tenha pessoas que percebem que são imperfeitas e precisam melhorar. Isso não acontece do dia pra noite, porém. Tanto é que muitas igrejas da época ainda se misturavam com a cultura pecaminosa local.


2.    Todos precisam se santificar, inclusive aqueles que parecem ter mais contato com Deus (1 Co. 13.1, 2): Corinto era uma igreja cheia de dons espirituais. Tanto é que Paulo precisa exortar a igreja sobre como utilizá-los devidamente na obra. Entretanto, era uma igreja que, por baixo dos panos, escondia pecados sérios, como divisão, pecados de ordem sexual e egoísmo (ceia). Por isso dizer que a manifestação dos dons é diretamente proporcional à santidade da pessoa é uma visão equivocada sobre santidade. Pelo contrário: Nossa santidade não é demonstrada por nossos dons, mas sim pelo fruto do Espírito (amor, alegria, paz, longanimidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio).


3.    Santidade é a forma de usar o homem para, a partir de sua mudança de vida, mostrar ao mundo a ação divina (1 Co. 1.28-29): Nosso passado nos condena, porém nosso presente restaurado choca, cria curiosidade e abre espaços para a pregação do evangelho. Ser santo é ser diferente  do molde do mundo, e mostra que não será com aquilo que o mundo pensa ser perfeito que Deus falará, mas sim com aquilo que o mundo despreza. 


Para encerrar e aplicar esta mensagem, trago três exortações:


1.    Não exija que o seu irmão seja perfeito. Trabalhe na sua caminhada e ajude-o na dele com paciência.
2.    Não exalte como exemplo de santidade aquele que aparece mais ou tem mais dons. Exalte aquele que se reconhece pecador e trabalha para melhorar.
3.    Busque ser santo em todos os seus círculos sociais. Não basta ser santo na igreja, é preciso ser santo na rua, na escola, no trabalho, no casamento, na faculdade, no clube, na praia.

10 passos para uma igreja melhor: Passo 6: Colaboração (At. 11.27-30)

Olá, prezados leitores e irmãos. Nos últimos dias, estudamos cinco passos para uma igreja melhor, mais sadia. Hoje, iniciamos a segunda metade de nossa série. Espero que gostem.

Um dos hobbies favoritos de um pastor costuma ser a leitura. Seja da Bíblia, seja de livros ou revistas, os ministros do evangelho costumam ser ensinados a ler desde o Seminário, pesquisando sobre diversos aspectos. Em uma dessas leituras, um pastor defendeu uma postura curiosa e recente nos EUA: A retirada, do nome da comunidade, da denominação à qual a igreja pertence. A ideia era a de retirar da cabeça das pessoas possíveis preconceitos quanto àquela igreja. Ou seja, fieis que não desejassem se associar a uma igreja X ou Y não rejeitariam aquela comunidade sem ao menos conhecê-la de perto.

O problema com esta postura é que ela aponta para um dos maiores problemas da igreja hoje: A denominaciolatria. Esse neologismo significa que muitas pessoas e igrejas esqueceram o seu propósito ao se associarem e passaram a tratar-se como pequenas seitas, guetos religiosos onde somente os seus membros são os verdadeiros guardiães da sã doutrina (e, em alguns casos, os únicos salvos por Cristo Jesus). Em troca da (justa) busca por uma identidade, várias denominações esqueceram-se do seu propósito principal, que deveria ser levar as pessoas a conhecer a Cristo, independente se elas ficarão ou não, afinal, uns pregam, outros colhem (1 Co. 3.6).

No outro extremo, temos histórias de igrejas que nasceram ou vivem à margem da denominação. Os motivos são inúmeros: Discordâncias quanto aos rumos que a associação toma, liderança egocêntrica, egoísmo comunitário. Já ouvi, certa vez, relato de um professor de seminário que ouviu de um aluno que ele estava ali porque “gostaria de ter o seu ministério”. Este aluno, com sua fala, acabou ilustrando o que acabamos de mencionar.

O fato é que a igreja primitiva agia de forma diferente das barbáries que vemos hoje neste sentido. Em Atos 11.27-30, vemos uma situação em que os habitantes da Judéia foram avisados de uma grande fome. Graças à intervenção de um profeta, chamado Ágabo, a igreja de Antioquia enviou recursos para o sustento da comunidade cristã da Judéia, permitindo que o centro do Cristianismo primitivo permanecesse vivo e íntegro. Essa atitude de Ágabo e da igreja de Antioquia nos remete a alguns princípios que devem nortear a relação entre as comunidades:

1.     Igrejas devem se reunir não por doutrina, mas por auxílio: Eu fico muito intrigado, às vezes, com a relação entre as megaigrejas e as igrejas mais pobres. Muitas vezes, vemos igrejas extremamente carentes, sofrendo para sustentar seus ministros, sem a menor condição material de manter um trabalho de educação cristã ou discipulado entre seus membros. Na ânsia de aumentar seus quadros de membros, as igrejas maiores ignoram as mais frágeis, levando a uma concentração de renda e membresia que lembra a distribuição de renda em nosso país.

Isso, muitas vezes, se deve ao processo equivocado de organização de uma igreja, especialmente no modelo congregacional, onde solta-se uma comunidade sem a menor estrutura à sua própria sorte. Há solução para isso, porém não é simples. Depende de muita conversa entre os líderes de cada igreja, para saber o que cada uma precisa e o que outras possuem para ceder. Desta forma, as igrejas conseguiriam se ajudar e trabalham em conjunto para aperfeiçoar a qualidade do serviço na obra de Deus para o alcance dos incrédulos.

2.     O auxílio deve ser dentro das possibilidades de cada um: Muitos líderes, na tentativa de exortar suas igrejas a ajudar na obra, acabam causando sérios problemas para suas comunidades. Às vezes, os motivos são nobres, porém, em outras oportunidades, os motivos são escusos (motivação política ou econômica, interna ou externamente à denominação). Na ânsia de fazer com que suas igrejas apareçam, acabam quase extorquindo seus fieis, pedindo ofertas cada vez mais altas sem uma finalidade aparente. Isso não é bom, pois torna a igreja em uma mera arrecadadora de recursos, quase como uma ONG.

3.     O sustento de todos começa com o sustento do todo: Muitas comunidades enfraquecem suas denominações por não contribuírem com ela. A denominação é a forma moderna de ajuda mútua entre igrejas que possuem uma mesma identidade. Líderes de várias igrejas sentam em conjunto para decidir formas de alavancar o processo de pregação do evangelho em áreas ainda não alcançadas. Devido a isso, a ajuda à denominação acaba ajudando as igrejas menores.

Um clássico exemplo é o da Convenção Batista Fluminense. Graças ao apoio que recebe das suas igrejas filiadas através do Plano Cooperativo, a Convenção oferece apoio de volta, sendo um dos mais interessantes a oferta de literatura de Escola Bíblica Dominical gratuitamente. Esta ajuda pode não parecer muito para igrejas grandes, porém, para igrejas pequenas e congregações, este apoio é vital para sanear as despesas iniciais e ajudar a igreja a melhor se gerir.

Conclusão

Uma igreja, para ser mais sadia, deve se relacionar com as demais igrejas do seu entorno e que professam a mesma identidade. É um relacionamento semelhante ao que Jesus disse para o homem: Se Ele nos mandou amar o próximo como a nós mesmos, devemos adotar esta postura não somente como cristãos, mas também como igrejas. Se crescemos como cristãos ajudando o próximo e recebendo esta ajuda, devemos também exercitar esta postura como comunidades. Somente desta forma, entendendo que participamos de algo maior do que nós, conseguiremos entender a visão que Cristo tinha para a sua igreja e poderemos amadurecer como cristandade.

Vivendo em um mundo reverso (1 Tm. 4.1 e 2 Pe. 3.3,4)

Viajar em transportes coletivos pode ser uma forma bem interessante de entender como está a sociedade nos dias de hoje. Basta pegar um metrô do Centro para a Zona Norte do Rio de Janeiro para perceber como a população torna-se uma entidade animalesca, ultrapassando as restrições do subconsciente aos nossos instintos, que insistem em aflorar a cada momento em que nossas emoções são despertadas pelo choque com o mundo frio e cruel.

Entretanto, enquanto realizava algumas de suas viagens para trabalhar, minha esposa pode vivenciar um fenômeno que tem assolado nossa sociedade há gerações, mas que parece estar piorando a cada dia: A inversão de valores. No mundo em que vivemos, não apenas parece haver uma ausência de verdades morais que norteiam o caminhar da população, mas sim uma completa subversão de suas mentes, fazendo-os agir contra todo aquele que mantém uma visão sadia e regrada da vida.

Os exemplos deste fato são variados, mas possuo dois para contar a vocês, amados irmãos e leitores. São fatos que podem parecer pequenos, mas que mostram bem como anda a nossa sociedade.

Primeiro, há algumas semanas, minha esposa estava em um ônibus quando um passageiro, embriagado, começou a brigar com um motorista que havia se atrasado porque ele estava substituindo um colega faltoso. Durante a confusão, as pessoas não se preocuparam com o bêbado que insistia em infernizar a vida do condutor do veículo, mas sim com o motorista, por ele estar pedindo para o ébrio sentar e se acalmar. Quando decidiu chamar a polícia para extrair o elemento do ônibus, os passageiros começaram a defender o bêbado e a criticar o motorista, exigindo que outra pessoa conduzisse o veículo. A situação só se resolveria tempos depois, atrasando a viagem, porém a postura dos passageiros ficou nítida: A vítima era o pinguço, e o culpado do estresse era o pobre do piloto.

Em outra oportunidade, a confusão se deu porque um motorista, da mesma viação, resolveu dirigir e falar no celular ao mesmo tempo. Todos sabem do perigo que é você dirigir apenas com uma mão (além de ser um ato passível de multa), e mesmo sendo um celular de rádio, ainda assim o risco de acontecer algo enquanto o condutor estivesse com apenas uma mão no volante era enorme. Uma passageira criticou o condutor, com razão. Porém, na saída dos passageiros, uma outra moça se dirigiu ao motorista e o elogiou pelo serviço bem feito! Com essa palavra, ela invalidou a crítica correta da outra e ainda cristalizou na mente do motorista a ideia de que está tudo bem em dirigir um veículo automotor com um celular na mão!

Talvez você já tenha passado por uma situação parecida: Alguém faz algo errado, outra pessoa tenta corrigi-la e as pessoas em seu entorno criticam aquele que fez a admoestação, defendendo aquele que está agindo equivocadamente. É impressionante, mas esta situação ocorre com uma enorme frequência. Isso acontece até mesmo na igreja. Conheço uma situação em que um líder de adolescentes descobriu que uma das moças, participante do grupo de coreografia, teria “ficado” com outra moça. Ao mencionar o fato à mãe (também evangélica), ouviu que ele não tinha o direito de criticar a jovem e que ela tinha o direito de fazer o que quisesse! Em outro caso, um pastor tentou conduzir uma equipe de louvor, por tocar uma música com a qual ele não concordava, e acabou causando um rebuliço na igreja onde ele quase foi demitido.

O fato é que as pessoas, nos dias de hoje, querem ter a liberdade para fazer o que bem entendem e se ressentem daqueles que tentam colocar um pouco de ordem na bagunça. São aquelas que xingam os policiais de trânsito por multá-las, apesar delas terem andado no acostamento sem poder. São aquelas que batem nas professoras que ousaram dar uma nota vermelha ou uma advertência a seus filhos. São aquelas que batem no pastor na porta da igreja porque ele quer encerrar um projeto que elas defendem, ou que ameaçam bloquear seu salário (seu único sustento, muitas vezes) porque ele ousou pregar contra o pecado que ele possui escondido.

Isso não é novo. Paulo comenta a Timóteo que, nos últimos tempos, muitos apostatariam da fé, dando ouvidos a espíritos enganadores e a doutrinas de demônios (1 Tm. 4.1). Outros, por não acreditarem em Cristo, vivem segundo suas próprias concupiscências, escarnecendo daqueles que tentam professar uma vida segundo valores universais, eternos (2 Pe. 3.3,4). Apesar disso, não devemos aceitar este tipo de comportamento. Devemos, sim, continuar a viver uma vida digna, correta, trabalhando para proclamar os valores que Cristo nos passou em seus três anos de ministério. Desta forma, agindo segundo seus ensinamentos e profetizando contra as mazelas deste mundo, poderemos fazer a nossa parte na árdua tarefa de entregar a nossos filhos um mundo melhor do que o mundo em que vivemos.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

10 passos para uma igreja melhor: Passo 5: Foco nas pessoas, e não em coisas (At. 2.42-46)

Boa tarde, amigos e irmãos leitores. Até agora, tivemos a oportunidade de vencer quatro passos em direção a uma igreja melhor, mais saudável. Vimos que uma igreja saudável, segundo os parâmetros bíblicos, deve ser missionária, dependente do Espírito, bibliocêntrica e sincera. Hoje, veremos que uma igreja saudável é uma igreja que tem suas prioridades corretamente direcionadas.

As igrejas modernas são conhecidas por investirem milhares, às vezes milhões de reais, em infraestrutura. A cada dia que passa, templos cada vez mais grandiosos surgem no horizonte das cidades. No bairro do Brás, em São Paulo, ficam atualmente a sede da Igreja Mundial do Poder de Deus, com 10.000 lugares, a Assembléia de Deus do Brás-Madureira (Pr. Samuel Ferreira), para 5.000 fieis, e uma catedral da Igreja Universal do Reino de Deus para 4.000 pessoas, além de ser o futuro local de construção do Templo de Salomão, custeado com recursos dos dízimos e ofertas de fieis da IURD de todo o Brasil (o valor orçado está acima de 200 milhões de reais).

O grande problemas das igrejas, hoje, é falta de visão. Investe-se muitos recursos para construção de templos faraônicos, porém não se pensa muito em investir recursos nas pessoas que visitam e congregam nestas igrejas. Com isso, algumas comunidades acabam morrendo por não conseguirem pagar suas dívidas, como a Igreja Renascer, no Brasil, e a famosa Catedral de Cristal, igreja americana que, com mais de 40 milhões de dólares em dívidas, terá que ser vendida para uma paróquia católica.

Quando voltamos no tempo e conhecemos a igreja primitiva, percebemos que o sistema de congregação deles era diferente. Em Atos 2.42-46, percebemos que a igreja primitiva oravam no templo, porém “partiam o pão”, ou seja, mantinham a comunhão, nas casas de algumas pessoas. Além disso, as pessoas vendiam suas propriedades e bens para distribuir com aqueles que não tinham condições de receber.

O que percebemos, como princípio deste texto, é que a igreja era atenta muito mais às pessoas do que a coisas. A ideia de congregar em catedrais e templos dedicados ao cristianismo surgiria apenas no séc. IV, quando o Cristianismo tornou-se uma religião tolerada pelo Império Romano com a conversão do imperador Constantino. Portanto, ao longo de 300 anos, a igreja se preocupava muito mais com as pessoas que se juntavam à comunidade do que o local onde estas pessoas seriam posicionadas.

É claro que este princípio deve ser contextualizado. Nós vivemos em uma sociedade muito mais complexa e competitiva, e tentar viver na forma como o povo vivia no primeiro século é algo utópico. Porém, podemos pensar em algumas ações práticas para implementar este princípio em nossas igrejas:

1.     Uma igreja sadia busca minimizar as diferenças e necessidades sociais de seus membros e seu entorno: É inadmissível, em uma comunidade cristã que diz que ama o próximo como a si mesmo, ter pessoas com mesas fartas e pessoas passando necessidades. Sabemos que isso acontece em algumas igrejas grandes, por isso a ação social deve trabalhar firmemente, sem interesse de trocar bolsas de alimentos por presença em culto. O Espírito não precisa de artimanhas para tocar nos corações das pessoas. Se alguém se converter, não será porque foi forçada a assistir o culto.

2.     Uma igreja sadia trabalha a sua infraestrutura de forma consciente: De que adianta um equipamento de som de última geração se o telhado está condenado? De que adianta assentos acolchoados caríssimos, se a igreja não evangeliza para preenchê-los? De que adianta construir uma igreja para 2.000 membros se a frequência dominical é de 500 pessoas, ou um templo de ouro e marfim sem estrutura de salas para educação religiosa? Uma igreja possui diversos departamentos vitais e que devem ser vislumbrados quando é feito o investimento.

3.     A igreja deve prestar atenção às necessidades dos seus freqüentadores: Estacionamento, em muitas igrejas, é vital. Em outras, o berçário é importantíssimo. Em locais quentes, o ar condicionado é indispensável. Já em locais frios, o aquecimento interno pode ser útil. O que importa é que uma igreja não pode dispensar o conforto (sem opulência ou exageros) para as pessoas que a frequentam.

4.     A igreja deve priorizar investimentos funcionais: Em muitas comunidades, os percentuais de investimentos em equipamentos de som e conforto no salão ultrapassam o valor dos investimentos em ministérios vitais para a permanência do fiel, como o ministério infantil, ministério com adolescentes e berçário. Se uma igreja deseja um crescimento saudável, deve prestar atenção nos pequenos, os que não têm condições de dizimar hoje, mas que poderão, no futuro, ser grandes líderes da comunidade.

Conclusão

Ao analisar o estado das igrejas de hoje, percebemos que muitas preferem investir em templos físicos, salões enormes, construções imponentes, sem pensar nas pessoas que utilizarão as dependências. A glória de Deus não se observa no tamanho dos templos, e sim nas vidas transformadas dos fieis que congregam ali. É por isso que uma igreja sadia não pensa primeiro nas coisas que pode comprar ou construir, mas sim nas pessoas que utilizarão aquelas coisas para a propagação da mensagem do evangelho. Se uma igreja consegue manter este foco, ela certamente terá grandes chances de crescer com saúde e firmeza.

Resenha: História Social do Antigo Israel, de Rainer Kessler

KESSLER, Rainer. História Social do Antigo Israel. Trad. Haroldo Raimer. São Paulo: Paulinas, 2009.

Recontar a história de Israel sob uma perspectiva diferente da tradicional. Esta é a intenção de Rainer Kessler ao escrever sua História Social do Antigo Israel. Ao longo de 240 páginas, o autor explora os conhecimentos adquiridos das ciências modernas sobre o Levante Sul para desenvolver uma visão minimalista da criação e evolução do Estado Israelita, correndo a história desde o surgimento da população hebraica na região da atual Palestina até o período de dominação helenista da região.

Para iniciar seus trabalhos, Kessler faz uma longa introdução, apresentando a ciência da história social, caracterizando-a como uma parte da historiografia que tem como objeto a forma (Gestalt) da sociedade a ser analisada. Ele alerta que a forma da sociedade é mutável ao longo do tempo, porém define que a História Social trabalha a forma de uma sociedade em seu ambiente histórico. Ao mesmo tempo, o autor caracteriza a história social como um método exegético, pois ele apresenta um novo enfoque sobre o texto bíblico: Os interesses sociais por trás de sua confecção.

A partir da definição do que é a História Social e qual é seu objeto, o autor caracteriza este, notando que a história dos eventos e a evolução da sociedade estática no tempo dinâmico são mutuamente importantes, mas que a História Social preocupa-se mais com as estruturas que a sociedade analisada assumiu em seus momentos de estabilidade. Após isso, o autor qualifica o signo “Sociedade”, apresentando-o como um conjunto de instituições relacionadas e inseridas em épocas bem definidas.

Após apresentar um breve histórico dos autores e estudiosos que desenvolveram seus campos de pesquisa nesta área, o autor introduz os métodos da história social de Israel, distinguindo-os em quatro: Análise do ambiente (geográfico e histórico) da sociedade analisada, estudo das heranças materiais deixadas pelo povo estudado (arqueológicos e epigráficos), análise das narrativas bíblicas sobre o período estudado e a busca de analogias à situação estudada, com a pesquisa das sociedades no entorno de Israel, estudo etnológico da sociedade e composição de categorias sociológicas com base nos achados anteriores.

Após introduzir a ciência e seus métodos, o autor passa a construir a sua História Social de Israel, estudando as suas diversas épocas constitutivas. Para seus estudos, o autor parte do período do Bronze Recente (1550 a 1200 a.C.) e desenvolve a história de Israel em seis fases: o seu nascimento como uma sociedade de parentesco, a evolução do Estado primitivo ao Estado desenvolvido em Israel e Judá, a formação de uma antiga sociedade de classes, o Exílio e suas consequências sobre o povo, a sociedade provincial no período persa e a convivência e forma do povo no período helenista.

O autor inicia seu trabalho sobre o estudo da História de Israel analisando o seu nascimento como uma sociedade baseada no parentesco. Para isso, o autor analisa as características da sociedade canaanita a partir da idade do Bronze Recente, como uma sociedade formada por diversas cidades-Estado, independentes porém convivendo tensamente entre si, com períodos de cooperação e outros de concorrência. O colapso desta sociedade teria levado a um posterior repovoamento, com pessoas de diferentes origens e por um longo período, em um processo evolucionário

Após estudar as possíveis origens do povo hebreu, o autor analisa suas estruturas. Inicialmente, ele entende que a melhor nomenclatura para a fase pré-estatal de Israel seja a de sociedade baseada em parentesco. Ele compreende a estrutura social familiar da época a partir do eixo Israel-Tribo-Clã-Casa-Homem, apresentado nos relatos de Js. 7,14-18 e 1 Sm. 10,18-21, com uma identificação baseada na adoração a YHWH e a uma consciência genealógica de ancestrais em comum, liderados por um sistema plural (anciãos) e ocasionalmente singular (os juízes, líderes carismáticos levantados para solucionar questões pontuais).

Após esta análise, o autor trabalha o desenvolvimento dos Estados de Israel e Judá, comentando que nesta fase é finalmente possível elaborar uma história dos eventos da grandeza com a qual o nome Israel está vinculada. Inicialmente, o autor descreve brevemente o relato bíblico da história de Israel, desde o reino unido de Saul e Davi até a divisão dos reinos e a destruição de Israel pelos Assírios no final do séc. VIII. A seguir, o autor divide o estudo do período em três partes, utilizando-se de fontes historiográficas e arqueológicas para tal: O surgimento do Estado (com uma teoria contrária à apresentada em 1 Sm 8), a sociedade sob domínio monárquico e o perfil do reinado israelita e judaico.

Depois de estudar o desenvolvimento dos Estados de Israel e Judá, o autor trabalha a formação de uma antiga sociedade de classes, posicionando esta formação no período entre a queda dos dois reinos (722 a 586 a.C.). O autor mostra como, neste período, começa a haver uma maior diferenciação entre grandes e pequenos economistas agrários, levando eventualmente à escravidão dos mais pobres pelos mais ricos. Isso leva a críticas severas de homens que se portam como porta-vozes de YHWH (os profetas), mostrando a relevância e abrangência dessas relações, e a eventuais intervenções para impedir um colapso da sociedade, como a criação do direito e atos reais para dirimir injustiças.

Após estudar esta fase, o autor trabalha o período do exílio e suas consequências para a organização da sociedade israelita. Ele nota que a elite do povo acabou caminhando para o exílio, seja por imposição dos babilônios, seja por vontade própria, enquanto que a população da terra foi deixada no local, sendo governada por líderes babilônios, o que a levou a tomar posse das terras dos poderosos. Inicialmente, a terra teria ficado desolada, porém, com o tempo, o povo se estabeleceu e conseguiu viver bem debaixo da nova liderança babilônica.

A seguir, o autor trabalha o período persa da história de Israel, comentando a história do Levante Sul desde Ciro até Alexandre. O autor nota o surgimento da rivalidade Samaria-Yehud e mostra como os moradores da província de Judá não eram totalmente judeus (assim como nem todos os judeus foram morar em Yehud), o que provocou o surgimento de casamentos mistos no seio da sociedade judaica.

Ele também mostra como a quebra de famílias devido ao aumento da escravidão dos pobres por parte dos mais ricos e a volta da elite para a terra, encontrando-a ocupada pelo “povo da terra”, contribui para um acirramento do relacionamento entre elite e povo e a uma quebra da sociedade familiar, gerando o mecanismo das listas genealógicas para identificação de pertença do homem com a grandeza Israel. É também nessa fase que, segundo o autor, o sumo sacerdote passa a ter sucessão dinástica, assumindo a figura do rei.

Por fim, o autor trabalha o período de dominação helenista, mostrando o desenvolvimento da sociedade judaica nesta fase. O texto mostra o surgimento das províncias da Judeia, Samaria e Galileia, a associação da elite com o povo helênico e da ligação maior do povo com os escritos judaicos, levando ao surgimento, respectivamente, dos grupos religiosos dos saduceus e fariseus, o acirramento de contradições sociais, com o surgimento de grandes famílias que buscavam o domínio do posto sacerdotal através de violência ou subornos e a miserabilização da população pobre.

O livro em si é extremamente bem conduzido em sua redação. Com linguagem simples, porém não simplista, o autor consegue passar perfeitamente o conteúdo que deseja, mesclando com maestria o relato bíblico com as descobertas arqueológicas e historiográficas. Vale ressaltar que o autor trabalha sob uma perspectiva minimalista moderada, o que faz com que sua leitura do texto bíblico seja heterodoxa. Isso, porém, não invalida seu esforço de construir uma história social de Israel.

No total, a obra de Reiner Kessler é um excelente esforço de pesquisa e concisão do conhecimento histórico atual e traz, certamente, uma nova luz sobre a história do povo judeu, desde sua formação até a época do Novo Testamento. A evolução das grandezas sociais do povo ajuda a compreender a situação do Levante Sul na época de Jesus e, por isso, merece ser lido e estudado por todos os estudiosos da Bíblia e cientistas sociais.

10 passos para uma igreja melhor: Passo 4: Sinceridade (At. 5.1-10)


Boa noite, pessoal. Nós temos analisado alguns passos para o crescimento e melhoria da igreja. Identificamos, nos últimos estudos, que a igreja precisa ser missionária, depender do Espírito e bibliocêntrica. Hoje iremos meditar sobre a necessidade da igreja ter relacionamentos sinceros, sem falsidade. 

Parece incrível, mas não é incomum em uma igreja as pessoas viverem relacionamentos de fachada. As pessoas apresentam-se com uma roupagem de crente, não só com vestimentas, mas com discurso e atos que se enquadram com o aceitável pela comunidade. Entretanto, muitas vezes, esses relacionamentos são superficiais, com conflitos subjacentes que, por vezes, prejudicam a comunhão e causam problemas graves à igreja.

O fato é que este tipo de relacionamento nunca foi a intenção de Cristo para a sua igreja. Ao longo dos evangelhos, vemos que Jesus incentivou os seus filhos a terem um relacionamento aberto e compreensivo um com o outro e com Deus. Ele teve que corrigir alguns comportamentos curiosos no meio do grupo de discípulos, como o desejo de primazia no grupo terreno e a vontade de sentar ao seu lado nos céus. 

Porém, é da natureza do ser humano agir pensando no que os outros irão achar, ao contrário do que Deus pensa. Em especial, é comum vermos, no seio da igreja, pessoas fingindo serem santas, ou grandes filantropos, agindo para aparecer para o público. Entretanto, em seus corações, vemos que seu desejo não inclui Deus na equação, e acabam cometendo barbaridades, como brigas com irmãos, divisões, maledicência e impiedade com os mais fracos. 

Um grande exemplo bíblico de pessoas que queriam aparecer para o grande público é Ananias e Safira (At. 5.1-10). Sabemos, pelos versículos finais do cap. 4, que as pessoas que vendiam posses grandes para dar à igreja eram naturalmente elogiadas e queridas pela comunidade (Barnabé chega a ser citado de nome por isso). É provavelmente por isso que Ananias e Safira resolvem enganar a comunidade, vendendo seus bens e dando apenas uma parte dos recursos para a igreja. Ao fazerem isso, denunciaram algumas características que afligem muitos cristãos falsos em nossas igrejas.

1.       Falta de confiança em Deus: Ananias e Safira não confiaram no sustento que poderiam receber da comunidade, ao venderem seus bens e darem totalmente seus recursos à igreja. Ao fazerem isso, não acreditaram que Deus poderia provê-los através da igreja primitiva.

2.       Inveja: Ao quererem aparecer, demonstraram inveja pela visibilidade que outros irmãos estavam tendo com seus atos de bondade e liberalidade. 

3.       Orgulho: Safira, em especial, poderia ter confessado seu pecado ao ser questionada por Pedro, mas não o fez por orgulho. Acabou pegando o preço com sua vida.

A conclusão que chegamos, ao estudarmos o texto, é que Deus tentou dar um alerta à igreja prmitiva, para impedir que ela se contaminasse logo de cara. Isso ajudou a comunidade a crescer, porém, hoje, vemos muitas igrejas que sofrem justamente por terem membros (dos líderes aos liderados) que vivem uma vida de fachada, de falsidade, dizendo ser uma coisa mas não agindo conforme aquilo que dizem ou pregam. 

Uma igreja, para crescer, precisa entender que ela não precisa ser perfeita ou feita de gente perfeita. Pelo contrário, uma igreja, para crescer, precisa de gente sincera, que se reconhece falha, que se confessa falha, que se apresenta para melhorar e trabalha para isso. Uma igreja de gente sincera reconhece seus erros e busca consertá-los. Uma igreja de gente falsa exclui os falhos e vive uma vida hipócrita, sem perceber que seus próprios corações precisam ser quebrantados.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Meu currículo ministerial

Certa vez me falaram que as igrejas escolhem seus futuros pastores com base em seus currículos ministeriais. Como sou pastor auxiliar e, um dia, alguma igreja pode desejar me entrevistar para tornar-me pastor-presidente, decidi colocar abaixo o meu currículo.

1. Pecador convicto: Assumido desde 1991, quando aceitei o sacrifício propiciatório de Cristo para expurgar minha natureza pecaminosa e dar-me vida eterna.

2. Homem falho: Sou cheio de defeitos e peço sempre a Deus que me conserte e me oriente no objetivo de aprimorar-me e alcançar a estatura de varão perfeito, algo que sei que não alcançarei nesta vida.

3. Servo de Cristo: Disposto a fazer o que Ele ordenar para minha vida. Sempre penso em perguntar a mim mesmo, antes de qualquer decisão a tomar, "Em meus passos, o que faria Jesus"?

4. Escravo da Palavra de Deus: Não admito teologias vindas de revelações espúrias ou opiniões humanas. Se a Palavra de Deus não trata do assunto, é anátema para mim.

5. Líder servidor: Não gosto de tomar as glórias dos trabalhos para mim, e me policio diariamente contra o ego que insiste em se inflar, a cada elogio recebido. Prefiro fazer minha equipe brilhar, minha igreja crescer, trabalhando para ajudar os outros a alcançarem seus potenciais. O crescimento da igreja não vem do pastor, vem das ovelhas, pois é ovelha que gera ovelha.

6. Adulto, mas nem tanto: Gosto de debates filosóficos e gosto de jogar bola. Adoro meditar sobre a vida e sobre a escalação do meu Flamengo. Leio Teologias Sistemáticas e revistas em quadrinhos. Assisto documentários históricos e filmes de desenho animado. Ouço música clássica e rock. Sou sério quando preciso e jovial sempre que posso.

7. Líder de prioridades: Deus, família e igreja. Nesta ordem. Se tiver que escolher entre o recital dos alunos de minha esposa e uma vigília de oração, vou para o recital sem piscar duas vezes.

8. Homem de visão definida: Pessoas antes de coisas.

9. Contemporâneo, mas nem tanto: CC, HCC e cânticos espirituais possuem a mesma importância no culto e nunca devem ser singularmente priorizados. Nenhuma melodia é tão boa que não possa ser modernizada ou transformada para se moldar às necessidades da igreja.

10. Conteúdo antes da forma: Prefiro 10 adolescentes de bermuda no culto matutino do que 10 adolescentes de sunga na praia, porque não querem ir de calça à igreja debaixo de um calor de 40 graus.

E quanto ao resto, é tudo consequência deste currículo. Lugares diferentes trarão projetos e resultados diferentes.

O que fazer, o ótimo ou o bom? O dilema da organização eclesiástica

A vida é um contínuo de decisões difíceis que precisam ser tomadas. O tempo e as circunstâncias nos levam a tomar posturas ou trilhar caminhos que podem ou não nos levar a um objetivo almejado. Contudo, por não conhecermos todas as possibilidades, muitas vezes ficamos congelados ou tomamos decisões das quais nos arrependemos profundamente, mais tarde.

Um dos maiores conflitos que surgem na vida de um pastor e de uma igreja é a forma como deve organizar sua diretoria ou liderança para o trabalho eclesiástico. Os problemas que surgem são vários: Líderes em potencial com problemas em suas vidas, equipes com desavenças internas, pessoas egocêntricas que acham que somente a sua vontade prevalece, etc. Neste cenário, uma das grandes dúvidas que surge é: Devemos mexer em algo que está bom, para fazer melhor? E se fizermos isso, quais os riscos que cometemos?

Existem alguns cenários onde o que está bom pode e deve melhorar. Por exemplo, quando ministérios já estabelecidos há anos desenvolvem trabalhos e atividades que não alcançam os resultados que poderiam. São casos onde os membros da equipe poderiam dedicar maior tempo para se capacitarem naquela atividade. Exemplos clássicos são equipes de louvor, ministérios com crianças e equipes evangelísticas. Em todos estes casos, existem inúmeras formas de realizar suas tarefas que podem ser aprimoradas. Uma equipe de louvor pode aprender novas técnicas harmônicas, um ministério infantil pode adquirir novas literaturas, uma equipe evangelística pode realizar diferentes projetos de projeção da mensagem.

Existem outros cenários, porém, onde o que está bom pode ser mantido. Este é o caso em que há escassez de liderança. São várias as comunidades em que a mesma pessoa tem que se dividir em dois ou três ministérios. Neste processo, a pessoa dificilmente consegue ser excelente em todos, porém ela mantém um bom nível de atividade, em todas as áreas de trabalho. Se ela foca em uma atividade, abandonando as outras, pode incorrer no erro de estragar um trabalho que funcionava, acabando com um trabalho que poderá fazer falta no futuro.

Esse caso é bastante interessante, porque cabe ao líder da comunidade perceber como suprir esta demanda. Não basta apenas deixar um trabalho bom para tornar outro ótimo. É necessário crescer os dois trabalhos, gradualmente, para que cresçam do bom para o ótimo. É um processo mais longo e penoso, porém traz resultados muito mais sólidos. É como a construção de uma casa: Você tem 4 alicerces bons. Você pode construir a casa em cima de um alicerce ótimo apenas? Pode, mas ela não ficará firme, penderá para apenas um lado e pode cair facilmente nos outros três cantos. Mas você pode construir uma casa mais simples em cima de quatro alicerces bons e melhorá-la conforme vai aprimorando os quatro alicerces.

É claro, esta é a minha visão. Não é Bíblica, é humana e corrente. Ou seja, pode ser alterada, pelo tempo, opiniões contrárias ou por intervenção divina.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A Teologia do Quadrado (Tt. 1.9, Hb. 3.12-13, Cl. 3.16, Gl. 6.1, Ef. 4.2)

O Facebook pode ser uma praga, às vezes, porém ela pode nos levar a uma inspiração que nos leva a meditar sobre algum aspecto de nossas vidas. E foi exatamente em um momento desses que tive uma meditação legal sobre o estado de nosso cristianismo.

Tudo começou com uma singela frase de um irmão de minha igreja e amigo de longa data. Ele comentou que era muito ruim receber críticas de pessoas que tinham sua vida totalmente errada. Até aí, nada demais. Realmente, é ruim mesmo ver pessoas com traves no olho criticando seu cisco. Porém, ele completou a frase com um conhecido ditado contemporâneo: "Cada um no seu quadrado".

Logo que vi a mensagem, respondi que não era adepto da "Teologia do Quadrado", e meu pastor riu da definição, dizendo que nunca havia falado desta "Teologia". Foi então que meditei sobre o tema e percebi que, hoje, vivemos em muitas de nossas igrejas exatamente isso. A "Teologia do Quadrado".

E o que é essa Teologia, você me pergunta? É simples: É a ideia que muitos cristãos têm de que eles devem viver conforme suas consciências, suas ideias, seus corações, independente do que outras pessoas ou fontes possam dizer. Isso, na verdade, não é característico do cristão: É um traço da cultura pós-moderna. Em nossa sociedade, houve uma diluição dos valores. Hoje, o indivíduo é autônomo em seus ideais e valores, e ignora valores superiores, metafísicos. É por isso que se diz "Cada um no seu quadrado":
Todos querem viver suas vidas sem interferência, comentários, conselhos ou exortações de outras pessoas.

O que se vê em muitas igrejas, hoje, é exatamente isso. Não é à toa que as igrejas que mais crescem no Brasil são as igrejas em que não há nenhuma vinculação de membresia. As igrejas deixaram de ser comunidades formadoras de discípulos para serem lojas da fé, mercados e hospitais onde as pessoas entram e saem de acordo com sua vontade para receber a bênção que desejam. Se concordam com a mensagem pastoral, permanecem. Se discordam, saem e buscam outra que se alinhe aos seus valores pessoais.

Neste meio, o trabalho pastoral acaba sendo muito prejudicado. Como as pessoas dão mais valor à sua própria consciência, ignoram completamente a mensagem bíblica e o conselho pastoral. São pessoas de coração duro, que não entendem suas posturas muitas vezes pecaminosas como algo errado, por mais que se explique as consequências nefastas destas posições. É como o velho "Nada a ver". O que as pessoas fazem não tem "nada a ver" com Deus, pecado, vida espiritual. Falar mal dos outros pelas costas não tem nada a ver. Ter relações sexuais antes do casamento não tem nada a ver. Ir pra balada e beber não tem nada a ver. Com isso, quando são questionadas, acabam adotando a postura do quadrado: "Não se meta na minha vida, que eu me entendo com Deus". O problema é que não há como "se entender" com Deus sem ler a sua Palavra, e a Bíblia nos aponta alguns caminhos sobre o assunto:

1. É função ministerial a exortação (Tito 1.9): Paulo aconselhou os aspirantes ao pastorado a exortarem suas ovelhas no "reto ensino", ou seja com base nas Escrituras (Cl. 3.16a). Exortação sem Palavra é opinião.

2. É uma atividade da igreja a exortação mútua (Hebreus 3.12-13): O autor, aqui, aconselha aos irmãos da igreja a se exortarem mutuamente (em um diálogo, um a um, e não em confusões grupais), para que o grupo não fosse contaminado em seus corações pelo pecado. E notem que o autor percebe que o pecado engana, ou seja, ele não se apresenta como pecado e leva a pessoa a crer que o que ela está fazendo NÃO é pecado.

3. A exortação deve ser sábia (Colossenses 3.16): Paulo recomenda à igreja de Colossos que se aconselhem e instruam com sabedoria. E nota-se que deve ser acompanhada de louvores a Deus, o que denota que ela deve ser vista como algo benéfico, vindo do Alto para que possamos melhorar em nossas vidas espirituais e nossa busca por uma vida sadia e santa. Um outro detalhe é que críticas destrutivas, de cunho ofensivo, não são sábias, mas só servem para gerar mágoas e divisões.

4. A exortação deve ser branda (Gálatas 6.1): Em nossa ânsia pelo zelo, podemos incorrer no erro de nos irar na hora de corrigir alguém (confesso, aqui, meu pecado). Paulo, porém, exorta a igreja da Galácia a corrigir aqueles que falharam com espírito de brandura, ou seja, de mansidão, um dos aspectos do fruto do Espírito.

5. A exortação deve ser feita com amor (Efésios 4.2, 1 Corítios 4.21, 16.14): No diálogo entre os cristãos, deve-se considerar que problemas surgirão. Porém, devemos sempre ter no coração o espírito de amor pelo próximo. Exortamos, aconselhamos, não por causa dos outros, mas por causa da própria pessoa exortada, porque a amamos e queremos o melhor para a vida dela. E este deve ser o espírito do conselho no seio da igreja.

Conclusão

Eu sei que esta palavra encontrará MUITAS críticas. É natural, pois uma igreja onde cada um vive no seu quadrado dificilmente demonstra ou desnuda seus problemas. É uma igreja mais fácil de liderar, mais fácil de pertencer. Entretanto, creio que esta não era a intenção de Cristo para seu povo. Ele queria que as pessoas conversassem entre si abertamente e se sustentassem espiritualmente. Se não fosse assim, não faria sentido o texto de Mateus 18.15-17.

Em suma, eu creio que a exortação, o conselho, a instrução, são partes vitais do ministério pastoral e da vida comunitária na igreja. Todos os cristãos deveriam compreender isso e, a partir de uma humilde reflexão, se abrir para este saudável diálogo. Somente assim, uma comunidade pode se chamar de Comunidade Terapêutica.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

10 passos para uma igreja melhor: Passo 3: Primazia escriturística (At. 17.11)


No último estudo, meditamos sobre a dependência que a igreja precisa ter da ação do Espírito Santo. A igreja, para ser sadia, precisa entender a forma de ação do Espírito, não concentrando apenas em uma área da ação do Espírito em nossas vidas, mas entendendo todas as nuances de sua ação no mundo. Agora, buscaremos compreender o papel das Escrituras Sagradas na igreja e como elas podem ser bem ou mal utilizadas pela liderança para conduzir a igreja.

É sabido que uma das fortalezas da pregação neopentecostal é a dissociação da Palavra de Deus do conteúdo bíblico. Segundo estes pregadores, algumas pessoas recebem uma unção profética especial, que lhes dá condições de falarem em nome de Deus, como um canal direto do céu à Terra, Nesta condição, a palavra do pregador neopentecostal assume uma postura equiparada ou superior à Bíblia. Não são poucas as histórias relatadas sobre o assunto. Basta dizer de um certo pregador neopentecostal que, quando contestado pelos relatos bíblicos, disse “Eu não quero saber desse negócio de Bíblia, o que importa é o que Deus falou ao meu coração”.

O fato é que, hoje, temos muitas pessoas na igreja que também não querem saber de Bíblia. São as pessoas movidas pelo coração. O “Deus colocou no meu coração” ou “Deus me revelou” tomou o lugar do “A Bíblia me ensinou”, e, com isso, passaram a agir conforme suas próprias consciências. Não percebem que este foi exatamente o pecado do primeiro homem, que buscou o mesmo conhecimento do bem e do mal que Deus possuía.

O texto bíblico de Atos nos mostra que a igreja primitiva, apesar das manifestações miraculosas, jamais se afastou das Escrituras. Pedro, quando aconteceu o Pentecoste, citou Joel para informar aos judeus incrédulos que a vinda do Espírito Santo já havia sido anunciada. Estêvão, quando foi preso, também se defendeu utilizando as Escrituras para dizer que Jesus era o filho de Deus e o Messias esperado pelo povo. Não só isso, temos lições de igrejas que usavam as Escrituras para confrontar com os ensinamentos trazidos pelos apóstolos, como o caso da igreja de Bereia (Atos 17.11).

Pensando nessas passagens, conseguimos pensar em três lições sobre o relacionamento da igreja com a Bíblia:

1.       A mensagem bíblica aponta para Cristo: Pedro, Paulo, os evangelistas, todos eles analisaram o Antigo Testamento com o único intuito de revelar que Jesus Cristo era o Messias esperado. Textos de caráter cerimonial, no entanto, não foram mantidos pelos evangelistas. De fato, a principal razão do conflito de Paulo com a igreja de Jerusalém era que ele não aceitava que os gentios deveriam se sujeitar à circuncisão ou ao jugo cerimonial da Lei.

O que temos visto hoje, porém, é a utilização deturpada e desprovida de contexto da Palavra de Deus para atribuir a eles a condição de porta-vozes de Deus. Ao fazerem isso, criam doutrinas espúrias, de forma a dominarem o povo, o que não é e nunca foi o propósito de Deus. Pelo contrário, seu propósito sempre foi liberar o homem do pecado e de suas consequências.

2.       A mensagem bíblica engrandece a Deus: Pedro, Paulo e os evangelistas fizeram questão de demonstrar que os eventos e milagres que aconteciam à sua volta eram por causa de Cristo, e não por seus próprios poderes. Nunca interpretaram o texto com a intenção de se imputarem poder ou autoridade. Pelo contrário, o único poder que Paulo clamou para si foi o de pregar o evangelho como apóstolo, como servo de Cristo para levar o evangelho para os gentios. Também notaram que o Espírito Santo era o canal de bênçãos, e que Ele não era comercializável.

Ao vermos as igrejas de hoje, percebemos que muitos pregadores têm deturpado a mensagem bíblica para atribuírem poderes a si. Não são poucos os que atribuem poderes mágicos a miraculosos a suas igrejas ou até mesmo a suas próprias pessoas. A graça de Deus deixa de existir e é substituída pelos milagres da rosa ungida ou do lenço embebido no suor do líder. Não só isso, cobram por seus milagres, ao contrário dos apóstolos, que faziam o que faziam para mostrar que havia e há poder em Jesus e que Ele era o Filho do Deus vivo.

3.       A mensagem bíblica é a única revelação de Deus aos homens: O Senhor inspirou homens para falarem sobre Ele, levar o povo a voltarem a seguir a sua Lei. Quando o povo engessou a Lei a ponto de afastar os homens de Deus, o Senhor teve que mandar seu Filho ao mundo para corrigir seus caminhos e se sacrificar pelos homens.

Não são poucas as igrejas que adotam como princípio doutrinário a revelação supra-bíblica e, com isso, extrapolam seus ensinamentos. É com base neste tipo de revelação que surgem no meio evangélico situações como o Cair no Espírito, a Unção de Toronto (ou Unção dos 4 Seres), a Confissão Positiva e outras coisas. Além disso, muitas pessoas se arvoram desta possibilidade para dizer o que as pessoas podem ou não fazer, podem ou não usar, podem ou não falar.

Conclusão

Quando estudamos a história da igreja primitiva, percebemos que os apóstolos tinham uma única missão na Terra: Propagar a mensagem do evangelho, a boa nova, de que Jesus Cristo era o Messias prometido no Antigo Testamento, o Filho do Deus vivo que veio ao mundo para morrer por nós e que havia ressuscitado e estava ao lado do Pai. Para isso, utilizaram as Escrituras Sagradas e deferiram a glória a Deus.

Portanto, para uma igreja ser sadia, ela também deve ter as Escrituras Sagradas como base de seus ensinamentos, usando como parâmetros de interpretação a deferência do poder a Deus, a salvação em Cristo Jesus e a sua exclusividade revelacional. Somente com estes parâmetros, uma igreja pode se dizer legitimamente cristã.

No próximo passo, veremos que uma igreja sadia precisa ser uma igreja sem fingimentos. Como base, usaremos a história de Ananias e Safira. Leiam-na e aguardem. Espero você.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

10 passos para uma igreja melhor: Passo 2: Depender da ação do Espírito Santo (At. 2)


No estudo anterior, tivemos a oportunidade de dar o primeiro passo na caminhada rumo a uma igreja mais saudável. Neste passo, reconhecemos que a igreja precisa compreender a sua missão na Terra, que é levar as pessoas a conhecerem a Jesus em toda a sua plenitude e a buscar uma vida de intimidade com Ele. Hoje, daremos o segundo passo, que fala sobre a autonomia da instituição no meio social.

Quando estudamos a situação de diversas comunidades de fé os dias de hoje, percebemos que a grande maioria deixou de enfatizar a sua associação-denominação para enfatizar a sua liderança. Antes, uma igreja se orgulhava de ser batista ou presbiteriana. Esta era a sua identidade, o seu cartão de visitas. Ao conhecer o nome da igreja, você sabia de imediato que aquela era uma comunidade com esta ou aquela característica. As pessoas sabiam o terreno em que estavam pisando.

Hoje, porém, a coisa está diferente. A identidade da igreja desviou-se de seu corpo doutrinário para a pessoa que está à frente dela. Não são incomuns os casos em que a Igreja XPTO possui, como continuação de seu nome o termo “Ministério Fulano de Tal”. Isso remete ao fato de que a Igreja cristã, hoje, se confunde com seu líder, seu pastor. Em muitos casos, essas igrejas mostram-se problemáticas porque as pessoas seguem seus líderes, por crerem que eles são canais da voz de Deus na Terra, o que gera individualismo, orgulho, insubordinação e divisões.

Este fenômeno não é apenas social, mas também teológico. Isso se deve ao fato de que um dos pilares da teologia de Kenneth Hagin é a Autoridade Espiritual, ou Teologia da Unção, onde se afirma que o líder da igreja recebe do alto uma unção especial de profeta, que lhe dá condições de falar em nome de Deus no mesmo nível de autoridade  que as Escrituras Sagradas. Ao fazerem isso, tomam diversas liberdades com o texto bíblico ou até mesmo o ultrapassam, deturpando-o ao seu bel prazer.

O fato é, porém, que a Igreja sadia não se baseia em achismos ou devaneios de seus líderes, mas sim na dependência de dois entes: O Espírito Santo e a Palavra de Deus, que compreendemos ser única e exclusivamente a Bíblia. Neste segundo passo, abordaremos a dependência do Espírito Santo e, no terceiro, falaremos da dependência da Bíblia.

O livro de Atos é bastante polêmico por razões óbvias para quem está inserido no meio evangélico atual: A divisão entre cristãos tradicionais e cristãos pentecostais se deve à interpretação da existência ou não, nos dias de hoje, do dom de línguas. Existem alguns textos que trabalham bastante esta temática: Atos 2, 9 e 19 e 1 Corintios 14. Os históricos, em geral, tendem a crer que o dom de línguas foi um fenômeno temporal, ou seja, foi circunscrito à época dos apóstolos, e que era um fenômeno onde pessoas falaram línguas humanas que desconheciam.  Já os pentecostais creem que o dom de línguas é atemporal, podendo ser buscado hoje, e que as línguas expressas nos textos seriam estranhas à humanidade. Seriam idiomas angelicais, citando 1 Co. 13 para denotar a sua possibilidade de existência. 

Contudo, independente da interpretação que se dá à questão, o fato é que o Espírito Santo foi uma figura ativa na fundação da Igreja de Cristo. Em Atos 2, vemos que o Espírito Santo desceu, dando condições aos homens de, falando em línguas (sejam estranhas ou estrangeiras), glorificar a Deus publicamente, independente da perseguição que Cristo sofrera. Com isso, houve um choque que atraiu a atenção do povo em geral e deu condições a Pedro de pregar o evangelho, causando a primeira conversão em massa da igreja primitiva e aumentando o tamanho do movimento do Caminho de 120 pessoas para mais de 3 mil.

Ao analisarmos este fenômeno, percebemos que não houve nenhum método novo, nenhuma estratégia evangelística, nada que fosse gerado pelo homem para buscar o alcance de almas para a salvação eterna. O que houve, pura e simplesmente, foi um derramar do Espírito Santo, tanto nos 120 que começaram a falar em línguas, quanto em Pedro, que pôde, de forma audaciosa e poderosa, falar que Jesus Cristo era Deus, o Messias esperado, para aqueles que o haviam julgado e matado, e que Ele havia ressuscitado e estava à direita de Deus, intercedendo por nós.

Por isso, ao pensarmos sobre a ação do Espírito Santo na igreja, precisamos lembrar de algumas coisas: 

1.       O Espírito Santo é Deus, e portanto, é o mesmo ontem, hoje e sempre, não só em seu poder, mas também em seu discurso. O grande problema de muitas igrejas, hoje, é entender que o Espírito é o mesmo de antigamente em poder, dando capacidades miraculosas aos homens, porém não compreender que o Espírito também possui o mesmo discurso, que é sempre de remeter o homem a Cristo. O Espírito Consolador está entre nós porque Cristo o enviou para nos acompanhar, nos dar poder e capacitar para pregar o evangelho. Não é fácil pregar uma vida ascética numa sociedade mundana e materialista. Remar contra a maré de toda uma estrutura social somente é possível pela ação e misericórdia de Deus, através de seu Santo Espírito. 

2.       O Espírito Santo, por ser Deus, não opera para levar homens a serem adorados acima Dele próprio: Uma das maiores blasfêmias que já li foi a de que o cristão pode se tornar Deus, por diversos métodos (santificação e Confissão Positiva são as principais). Entretanto, Rm. 8.16 nos conta que o Espírito testifica a Deus que somos filhos de Deus. Como filhos de Deus, ainda estamos em uma posição inferior, e, apesar de termos a salvação e termos sido adotados por Deus como seus filhos pelo sangue de Jesus vertido na cruz, ainda devemos obediência a Ele. Somos servos Dele, escravos de Sua Graça. Ele nos dá conforme Ele quiser, e os homens devem se ver única e exclusivamente como ferramentas para a propagação da Palavra de Deus e da salvação em Cristo Jesus ao mundo.  

3.       Quando a igreja depende do Espírito, ela não se aferra a costumes para decidir se alguém é fiel: Erro muito comum de várias igrejas é atrelar o cumprimento de diversos costumes por parte do cristão diretamente ao seu nível de espiritualidade ou de intimidade com Deus. Ledo engano. O que mais há nas igrejas, hoje, é crente “de fachada”, que veste roupas de crente, usa discurso de crente, porém esconde desvios de conduta seríssimos, como roubos, adultérios, maledicência, dissenções, dentre outros tantos. O Espírito não vê a fachada do crente, mas sim vê até o íntimo de seu coração. Uma igreja sadia é, portanto, uma igreja que retira suas máscaras, desnuda-se, mostra suas feridas e as trabalha. Desta forma, uma igreja ultrapassa os parâmetros de instituição para tornar-se uma comunidade terapêutica, onde as pessoas vão para se conhecer e curar suas mazelas, através do seguimento das diretrizes dadas por Jesus em sua breve passagem por aqui.

Conclusão

A Bíblia nos traz inúmeras qualidades apresentadas pelo Espírito Santo. Entre elas, a maior é a de convencer o homem do pecado, da justiça e do juízo (Jo. 16.8-11). O que resta é consequência desta missão. Assim deve trabalhar a igreja de Cristo que depende do Espírito. Ela deve ser uma igreja que compreende que o discurso do Espírito é o mesmo da Bíblia (e, portanto, não pode contradizê-la), não trabalha para elevar o homem a um status de adoração, e que se apresenta e reúne de forma honesta. 

Amanhã, estarei trazendo o terceiro passo para uma igreja se tornar melhor, mais saudável: A centralidade da Bíblia como fonte do seu discurso. Até lá.