Hoje estou iniciando uma série de estudos que pretendo, no futuro, transformar em mensagens. Eu estou aproveitando o tempo livre que tenho no momento, para meditar em algumas coisas.
O objetivo destes estudos é pensar sobre a igreja atual. Sabemos que a imagem da instituição "igreja" está muito desgastada nos dias de hoje, tanto é que muitas preferem se denominar "Comunidades". Entretanto, sabemos que há muitas experiências legais no meio cristão e pretendemos juntar essas experiências com o conceito bíblico de igreja, baseando-nos principalmente em Atos e em alguns textos paulinos.
Hoje, quero pensar (e repensar, como meu amigo Pr. Rodrigo Figueiredo gosta de comentar em seu blog) sobre a missão da igreja. É impressionante, mas é fato que tem muita igreja por aí que não sabe direito qual é a sua missão no mundo e, por isso, acaba patinando na hora de estabelecer suas prioridades ou rumos. Por exemplo, vemos igrejas gastando esforços e destruindo relacionamentos em reuniões de horas de duração para decidir se devem restaurar os antigos bancos de madeira ou se devem adotar modelos acolchoados, mais modernos. Outras igrejas destinam seus recursos mais para eventos internos do que externos. Pregadores ministram mensagens de auto-ajuda, sem um objetivo claro. Outras igrejas pensam no melhor método de arrecadação de recursos, seja dízimos ou ofertas. E a verdade é uma só: Nada disso deve ser a missão de uma igreja, não deve ser aquilo que a faz caminhar, não deve ser a sua razão de existir.
E qual deve ser essa razão de ser, de existir da igreja? O fato é que Lucas já retrata, em Atos 1.8, um conselho de Jesus sobre o tema, complementando o texto de Mt. 28.20-21. Lendo estes textos, percebemos que a igreja precisa compreender que a sua missão é levar pessoas a conhecerem a Cristo em sua plenitude e a terem uma vida de intimidade com Ele. Para isso, ela precisa compreender que:
1. Os planos podem ser os mais diversos, mas é o Espírito Santo quem faz todo o trabalho. Jesus fala, no texto de Atos, que os discípulos receberiam poder quando o Espírito Santo descesse sobre eles, e que isso os daria condições de serem testemunhas de Cristo por todo o mundo. Isso já aconteceu, no Pentecostes, mas ilustra que, sem o Espírito, os discípulos poderiam fazer 1001 planos mirabolantes, que não conseguiriam cumprir os planos que Deus tinha para eles.
Isso é vital, pois tem muita gente por aí que chega em uma igreja e imediatamente tenta implementar um modelo miraculoso de multiplicação de membresia. Todos esses modelos possuem algo em comum: Dizem-se inspirados por Deus. Eu não duvido que Deus possa inspirar alguém a fazer um trabalho de forma específica, porém a igreja precisa compreender que todos os modelos possuem falhas e funcionaram em contextos e locais bem específicos. O Espírito Santo não está entre nós para trazer novos modelos de igreja, mas sim para convencer o homem do pecado, da justiça e do juízo, além de consolá-lo e acompanhá-lo em seus passos. Qualquer coisa além disso, são fórmulas humanas que podem dar certo... Mas o "como" deu certo é que torna-se vital para nós.
2. O trabalho com o fiel deve ser focado nos ensinamentos de Cristo: Em Mt. 28.20-21, Jesus diz para seus discípulos saírem pelo mundo conhecido fazendo novos discípulos, ensinando-os aquilo que Jesus os havia ensinado durante os três anos que eles passaram juntos. Isso significa que o novo cristão deve ser incentivado a conhecer e praticar os ensinamentos de Cristo para nossas vidas, em todas as suas nuances e complexidades.
Hoje em dia, muitas igrejas têm pecado nesta área. Algumas igrejas, por adotarem modelos que priorizam a multiplicação rápida da membresia, preparam cursos superficiais e altamente direcionados para formação de líderes de células ou pequenos grupos, esquecendo de discipular o fiel e explicar a ele todas as complexidades da vida cristã. Outras igrejas focam em ensinamentos que visam apenas a recitação de uma fórmula mágica que irá ativar para ela nesta realidade aquilo que ela deseja (esta fórmula se chama Confissão Positiva, e estarei em breve trabalhando ela aqui no blog). E outras, enquanto isso, apresentam sistemas de educação religiosa arcaicos, de recitação de textos de revista, sem contextualizar o conteúdo bíblico para a realidade complexa de cada fiel. O que é certo é que não existe dissociação entre um cristão e um discípulo de Cristo. Se uma pessoa vai à igreja mas não prioriza em sua vida a aplicação dos ensinamentos de Cristo em toda a sua abrangência, ela não pode ser chamada de cristã. Crente, talvez. Evangélica, até vai. Mas "cristã", não.
3. A igreja deve pregar o Cristo em toda a sua complexidade: Ao longo dos evangelhos e dos escritos neotestamentários, podemos ver Jesus Cristo com três papeis principais: Rei, Profeta e Sacerdote. Rei, porque Ele reina sobre todas as coisas, Ele é o Senhor de nossas vidas e a Ele devemos obediência. Profeta, pois Ele falou contra tudo o que há de errado no mundo e nos trouxe palavras de exortação, para nossa correção, e de esperança, para compreendermos que há uma saída para nossos defeitos. E Sacerdote, pois Ele ministrou a si mesmo, perfeito e sem pecado, como sacrifício na cruz, para obtermos perdão de nossos pecados. Se a igreja não pregar o Cristo em sua abrangência tríplice, ela comete uma falha com o fiel.
O que mais vemos hoje, no discurso das igrejas neopentecostais, é que o cristão tem direito a receber todas as bênçãos que desejar, pois ele é "filho do Rei". Entretanto, raramente pregam sobre o Sacerdote (pois ela envolve o reconhecimento, por nossa parte, de uma natureza pecaminosa) e nunca pregam sobre o Profeta exortador (somente sobre o motivador). Ou seja, em nome do mercantilismo da fé, muitos mensageiros "evangélicos" esquecem de exortar o cristão a mudar de postura frente ao mundo, ou quando o fazem, o fazem em um sistema de troca. Não é mais "Sede santos, pois Eu sou santo", mas sim "Sede santos, para poderem receber a vitória que VOCÊS querem". Este discurso, infelizmente, tem levado à destruição da fé de muitas pessoas e à queda moral da comunidade evangélica como um todo, pois nessas comunidades, ser santo não influencia em nada a dinâmica de troca do fiel com Deus.
4. A igreja deve se engajar no objetivo de ganhar pessoas, e não contribuintes: Tanto no discurso de Jesus quanto no discurso de Paulo, não há qualquer menção quanto a uma possível dinâmica de troca entre o homem e Deus para receber bênçãos. Os textos usados pelos pregadores da infame "Lei da Semeadura" são sempre mal interpretados, pois seu contexto sempre é o da pregação da Palavra de Deus (cf. Mt. 13, Mc. 4, Lc. 8).
O fato é que, nos dias de hoje, muitas igrejas estão mais preocupadas em ganhar contribuintes para seu ministério do que pessoas para Jesus Cristo. E, aqui, vemos de tudo: Igrejas que ministram apenas para pessoas de classe média alta, comunidades que trabalham pregando para músicos, igrejas se preocupando mais em vender carnês milagrosos ou recipientes com água do Rio Jordão do que apresentar o Deus que "supostamente" é a fonte dos milagres dos carnês e que permitiu que as águas do Rio fossem paradas para que Josué conduzisse o povo através dele.
Conclusão
Concordo com minha esposa Rosana quando ela diz que a vida, hoje, é muito complicada. Precisamos compreender que há muita gente iludida ou seduzida com as diversas propostas de crescimento miraculoso que inundam as livrarias gospel e as redes de relacionamento de líderes. Contudo, é preciso absorver todas estas propostas com sobriedade e à luz da Bíblia, separando o que é bíblico do que é humano. A partir disso, a igreja pode compreender a sua verdadeira missão na Terra e, a partir daí, utilizar as ferramentas e métodos que julgar convenientes para o alcance das pessoas de sua região.
Digo isso pois tenho plena certeza de que todo método humano, no seu devido contexto, pode funcionar. Porém, como disse antes, o mais importante não é "se" o método funciona, mas sim "como" ele funciona e o que ele produz. Se os frutos destes métodos forem cristãos verdadeiros, que buscam a Deus para adorá-lo e não para extorquí-lo, amém. Se não, precisaremos repensar tais métodos e repensar até mesmo o que somos. Deixamos de ser igrejas, passamos a ser comunidades mercantilistas da fé mágica.
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