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sexta-feira, 13 de maio de 2011

Revelação Geral (Instituto da Bíblia - Aula 2/5 - Base Histórica)

Aula 4 (Revelação – Aula 2/4 – Base histórica)

Ao longo da história da Igreja, o conceito de revelação foi bastante discutido, tanto nos círculos filosóficos quanto nos círculos teológicos. As questões da revelação geral e da revelação especial foram fonte de inúmeros debates, fomentando a criação de obras colossais sobre o assunto.


No tocante à revelação geral, a grande discussão sempre foi se seria possível provar a existência de Deus através da observação do mundo que nos rodeia. Estas são suas ideias principais:


1 – Pais da Igreja: Justino (c. 165) trabalhou esta questão defendendo que o Verbo de Jo. 1.1-4 era a “ponte da revelação” entre Deus e a sua criação. A Razão humana seria traços do Verbo no homem que apenas unia os homens a Deus e dava-lhes conhecimento Dele. Ou seja, a Razão poderia dar ao homem condições de se chegar a Deus.


Já Agostinho (354-430) quebra esta linha de pensamento, afirmando que é impossível ao homem alcançar o Deus inefável, por este ser uma verdade superior à razão humana, simplesmente descoberta (quando Deus se manifesta ao homem), e não “raciocinada”. Também vem de Agostinho os argumentos da existência de Deus a partir da constatação de que todos os povos têm uma visão sobre Deus e o fato do universo ser ordenado, mostrando um propósito em seu movimento.


Por fim, vale notar que o Concílio de Calcedônia (465) foi o grande responsável pela formulação teológica da separação entre o Criador e a criação, colocando categoricamente que tal junção acontece apenas na figura de Cristo.


2 – Idade Média: Durante o período conhecido como “Idade das Trevas”, houve pouca produção teológica, porém uma se destacou: A Suma Teológica de Tomás de Aquino (1224-1274). Nesta obra, uma enciclopédia de trabalhos sobre todas as áreas da teologia, Tomás de Aquino afirmou que era possível provar a existência de Deus através da lógica, seguindo cinco caminhos para tal:
a. O caminho da mutação: o mundo não é estático. Tudo o que move, é movido por outro ser, que é movido por outro ser, que é movido por outro. Em algum momento, um ser independente tem que ter iniciado este movimento: Deus.


b. O caminho da causalidade eficiente: todas as coisas não possuem em si mesmas a causa de suas existências. São consequências de outras. Logo, é necessário admitir uma Primeira Causa Eficiente, responsável pela sucessão de efeitos: Deus.


c. O caminho da contingência: Todo ser que existe pode deixar de existir. Se isso acontece, em algum momento, nada existiu. Se assim fosse, a eternidade não teria nada que existisse, a não ser que alguém criasse algo. Esse alguém é Deus.


d. O caminho dos graus de perfeição: Existem graus de qualidade de todas as coisas: Beleza, poder, verdade. Se existe um grau maior e um menor para estas qualidades, temos que admitir que existe um ser que possua o maior grau de beleza, poder e verdade no universo: Esse ser perfeito é Deus.


e. O caminho do finalismo: Tudo o que existe na criação tem uma função, uma finalidade. Há uma ordem na criação. Logo, precisamos admitir que existe um ser inteligente que dirige tudo o que há na criação para que cumpra seu objetivo: Deus.


Tomás de Aquino acreditava que tais ideias não poderiam ser questionadas por nenhum homem em sã consciência e que o homem poderia alcançar a ideia sobre Deus se o buscasse na criação. Porém, as coisas pertencentes à salvação só poderiam ser reveladas através das Escrituras e da tradição cristã interpretada pela Igreja. A consequência é que, para ser salva, uma pessoa precisava submeter-se à autoridade da igreja.


3 – A tradição evangélica


Tanto Lutero quanto Calvino foram fortemente influenciados por Agostinho e acabaram quebrando com a visão católica reinante, descrita no item 2. Ambos afirmaram que a razão natural é corrompida pelo pecado e incapaz de tirar conclusões corretas da revelação de Deus.


Sobre esta questão, Lutero elabora que Deus se revela claramente na criação e que a lei moral de Deus está escrita no coração das criaturas, de forma que todos têm um testemunho do que é certo e errado. Porém, a corrupção do homem faz com que a razão usurpe o lugar da fé, levando-o a se agarrar a algo abstrato e impessoal, um sonho “fabricado pelo diabo” .


Já Calvino reconhece que Deus se revela no interior do homem, através da consciência, e no exterior, através da criação, mas que este conhecimento de Deus é “ineficaz por causa do pecado” . As especulações filosóficas, sem a luz da Bíblia, seriam sempre deturpadas e não levam o homem ao conhecimento correto de Deus.


4 – Desenvolvimentos posteriores: Com o surgimento do movimento iluminista, nos sécs. XVII e XVIII, a questão da revelação geral de Deus foi desenvolvida por diversos filósofos, que adotaram várias linhas conflitantes de pensamento. Algumas ideias estão dispostas abaixo:


a. Rene Descartes (Racionalismo): O conhecimento de Deus pode ser extraído da capacidade racional do homem. A ideia de um Deus perfeito e infinito não poderia ser gerada por um homem imperfeito e finito. Logo, esta ideia só pode ter vindo de Deus.


b. David Hume (Empirismo): A razão trabalha a partir daquilo que absorve do mundo. Logo, a ideia de Deus que o homem tem não é “raciocinada livremente” por ele, mas vem da sua experiência com a igreja, com os ensinamentos que a sociedade lhe passa. Daí surge uma visão cética do mundo, onde Deus não se revela ao homem diretamente, mas sim é apresentado pela sociedade como algo incontestável.


c. Immanuel Kant: Deus não pode ser percebido pela visão do mundo, pois Ele está além do mundo físico. Para Kant, Deus não poderia, então, ter se revelado, seja natural, seja sobrenaturalmente.


d. Teologia Liberal: Deus não pode ser conhecido racionalmente, só pode ser conhecido misticamente, sendo representado por símbolos religiosos. “Toda teologia é uma construção de mundos simbólicos para enfrentar essa realidade, logo todas as religiões são sistemas de símbolos igualmente válidos para “conhecer” esse Deus” .


e. Naturalismo filosófico: Tudo o que existe no mundo é resultado de forças naturais, das “leis” da natureza e do acaso. Logo, para este grupo, não há Deus.


f. Neo-ortodoxia: Karl Barth afirma que não existe revelação geral, que Deus não se revela na criação, mas sim apenas na figura da Palavra, do Verbo, Jesus Cristo.


g. Concílio Vaticano II: O Cristianismo é a mais perfeita revelação de Jesus, a Igreja Católica é a mais perfeita expressão do cristianismo, porém os adeptos sinceros de outras confissões podem ser salvos por meio de Cristo, incluindo os ateus (chamados de “cristãos anônimos”), pois a revelação geral pode levar o homem a crer no poder de Deus.

Bibliografia
FERREIRA, Franklin e MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007.

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